quinta-feira, 16 de abril de 2009

Premissas

A proposta de diretrizes curriculares em jornalismo ora apresentada pelo Fórum Nacional de Professores de Jornalismo (FNPJ) baseia-se na proposta de diretrizes curriculares debatidas em seminário nacional realizado em Campinas-SP, em 1999, e no Programa Nacional de Estímulo à Qualidade da Formação em Jornalismo, das quais a entidade é signatária e co-autora. Além disso, fundamenta-se nas seguintes premissas:

1.1 O conjunto de instrumentos norteadores da formação do jornalista deve ser buscado na definição conceitual da atividade que se pretende ensinar. A pergunta “o que é jornalismo?” deve ter, necessariamente, precedência sobre idêntica problematização dirigida à área ou grande área em que esta atividade se situa;
1.2 Pela crescente importância que o jornalismo adquiriu nas sociedades contemporâneas, a formação do jornalista deve se afirmar na especificidade e identidade da atividade, e não na generalidade das áreas nas quais se situa.
1.3 Seguindo essa metodologia, todas as formulações deste documento baseiam-se no dado histórico de que o jornalismo da contemporaneidade é aquele que se convencionou chamar de informativo, que desde o século XIX suplantou a imprensa opinativa, embora os veículos noticiosos ainda reservem espaços para a opinião e a análise; E, aqui, é fundamental que o Jornalismo busque, sempre, refletir/projetar a pluralidade dos sujeitos sociais da contemporaneidade, para além de crenças, interesses particulares ou afins.
1.4 Partem da noção, também, de que o jornalismo informativo, como fenômeno social, se constitui como forma singular de conhecimento, comunicação, mediação e construção da realidade, e que se presta também, e por outro lado, a fins econômicos e de exercício de poder político;
1.5 Tal concentração no conceito e na especificidade do jornalismo significam o reconhecimento e a defesa da comunicação como grande área na qual o jornalismo deve se inserir como curso e profissão com identidades absolutamente próprias. Essa busca da identidade no campo acadêmico Está pautada em considerações teórico-epistemológicas, mas também na necessidade e exigência da sociedade, que não aceita, no campo profissional, a confusão do jornalismo com a publicidade, a ficção, o entretenimento e a comunicação institucional, embora o legitime como forma específica de comunicação e comunicabilidade social.
1.6 A constituição do jornalismo como curso específico de graduação também requer cursos de mestrado e doutorado próprios, ancorados na graduação e na profissão e visando não só a produção de reflexão crítica sobre a atividade, mas a preparação de futuros professores de jornalismo.
1.7 O preparo para o exercício do jornalismo requer uma a formação de caráter teórico-técnico e cultural de, no mínimo, quatro anos, ou 2.700 horas-aula, referenciada pela especificidade conceitual e técnica do jornalismo como instituição social e fenômeno histórico-social. Ensino teórico, técnico e formação cultura devem se fundir em uma só prática pedagógica, que não concebe o treinamento para o domínio das técnicas sem a reflexão sobre e não aceita a reflexão dissociada das aptidões técnicas e da singularidade da profissão;
1.8 O curso de jornalismo deve se estruturar, portanto, sobre um núcleo identitário constituído pelas teorias, pelas técnicas e pela deontologia do jornalismo, em espaços e atividades próprios à reflexão e ao treinamento, experimentação e produção de novos saberes (atividades laboratoriais). A partir desse núcleo gravitacional é que devem ser organizadas as interfaces com os saberes da grande área da comunicação e com aquelas que situem o profissional nos seus contextos político, econômico, histórico, geográfico, cultural, filosófico, social, psicológico, lingüístico, discursivo, tecnológico, ético e jurídico;
1.9 A formação do jornalista também deve levar em consideração a sua atualização frente a novas realidades políticas, culturais e tecnológicas, e para as possibilidades e demandas sociais como o jornalismo comunitário e as assessorias de imprensa, mas sem se descaracterizar conceitualmente e sem trair as aspirações da maioria da sociedade no que diz respeito ao direito dos cidadãos à informação de qualidade.
1.10 No que diz respeito às demandas das comunidades, a formação deve manter o foco no jornalismo, o jornalismo comunitário, sem qualquer necessidade de se descaracterizar como tal em prol de algo diferente, a comunicação comunitária
1.11 No que diz respeito aos novos suportes tecnológicos, deve significar:

a) a formação de um jornalista e não de comunicador polivalente, idéia da Ciespal já rejeitada pela realidade brasileira, embora se conceba, aqui, o jornalismo como uma forma específica de comunicação e que ser comunicação, indireta/mediada, é a fonte de toda a sua força e vitalidade;
b) a formação de um jornalista capaz de produzir e atuar em todos os suportes tecnológicos e não, necessariamente, de um jornalista multimídia, termo utilizado mais pelas corporações comerciais para eliminar grande número de jornalistas do mercado profissional, sobrecarregando os remanescentes e prejudicando drasticamente a qualidade da informação recebida pela população. O prefixo multi não deve ser entendido como sinônimo necessário de simultâneo, no sentido de o jornalista, por dominar todas as técnicas, linguagens e suportes tecnológicos, ser obrigado a operá-las simultânea ou quase simultaneamente, pois essa associação contribui para o diagnóstico apontado.
c) a formação de um profissional capaz de compreender criticamente os processos básicos de convergência tecnológica e discursiva e as suas implicações sociais, políticas, econômicas, culturais e jurídicas;

1.12 As novas tecnologias, ao invés de eliminar o jornalismo como instituição e o jornalista como profissional, só aprofundaram a necessidade social de ambos como instrumentos singulares de organização e mediação da imensa gama de informações que circulam pelas suas redes e de produção de informações novas, técnica e eticamente orientadas pelo interesse público e inspiradoras de credibilidade, segundo o perfil e as competências abaixo relacionadas. As novas plataformas tecnológicas de comunicação, especialmente a internet, abriram enormes possibilidades de comunicação e integração humana, tornando-se excelentes ferramentas de dinamização e democratização das relações sociais. Mas, embora troquem com muito mais facilidade informações e se comuniquem de forma muito mais eficaz, inclusive com veículos próprios e pessoais de comunicação como os blogs e sites, os cidadãos não se tornaram jornalistas. O conceito de cidadão-jornalista só revela, no nosso entendimento, a possibilidade bem maior do que antes de o cidadão colaborar com a mídia jornalística com informações, inclusive visuais, sobre fatos que presenciou, mas ele não ultrapassará a sua condição de fonte-testemunha, embora privilegiada, que raramente terá a preocupação ou poderá se dedicar a construir informação e discurso tipicamente jornalísticos, metodológica e eticamente orientados pelo interesse público, capazes de superar em profundidade e pluralidade de pontos de vista o testemunho ou a impressão pessoal.
1.13 A formação do futuro jornalista deve abrir espaço para a efetiva interação com o mundo do trabalho e dos ambientes em que se realizem atividades jornalísticas, quer sejam comerciais, públicos, comunitários, corporativos ou do terceiro setor. Tal aproximação deve se dar não só a partir de programas de estágio, de caráter necessariamente não-obrigatório e efetivamente acadêmico, mas também a partir de consórcios de produção de saber e troca de experiências, em formatos como projetos de pesquisa, palestras, reuniões, cátedras e outros;
1.14 A formação superior específica em jornalismo não só qualifica os profissionais e o jornalismo, atendendo às modernas exigências sociais e potencializando o direito dos cidadãos à comunicação e à informação como direito-meio para realização de outros direitos. Ela também democratiza o acesso à profissão. A transferência da competência para determinar quem integrará e sobre qual conhecimento se constituirá a corporação profissional, dos domínios exclusivos dos proprietários e dirigentes das corporações jornalísticas para as instituições de ensino, permite que todos os cidadãos possam ter acesso, desde que se submetam às regras e processos públicos de seleção;
1.15 A qualidade da formação em jornalismo não depende só das diretrizes curriculares, e dos projetos pedagógicos e das matrizes curriculares sobre elas construídos. Novas diretrizes curriculares exigirão, também, por parte do MEC e seus órgãos, novas diretrizes para os processos (1) de autorização e reconhecimento dos cursos e (2) de todas as etapas e instrumentos de avaliação. Todos eles precisam acompanhar a presente proposta de afirmação dos currículos na identidade do jornalismo;
1.16 A pouca clareza com o que se vem chamando de dupla diplomação é vista com bastante preocupação pelo FNPJ. Em princípio, reforçamos a noção de que dupla diplomação já existe, e pode existir, pois se caracteriza pela conclusão integral de um segundo curso. A intenção de permitir a portadores de diploma de outras áreas o exercício do jornalismo, com carga horária reduzida significa, na realidade:
a) a necessidade de legislação específica, o que é competência do Congresso Nacional
b) não uma dupla diplomação, mas uma formação complementar à primeira e incompleta do ponto de vista da segunda, isto é, das necessidades do jornalismo, segundo o que se debate no próprio processo de renovação das diretrizes curriculares;
c) um risco sério de descaracterização da profissão do jornalista;

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